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PROTÓTIPOS: NECESSIDADES DOS CLIENTES


Ainda que possa acontecer de uma tecnologia ter seu ponto de partida com a suposição de que ela trará determinadas vantagens, esses benefícios estarão sempre voltados para um determinado público-alvo. Isso quer dizer que não é incomum que as tecnologias iniciem com a imaginação dos cientistas. Imaginar é supor que algo vai se comportar de determinada forma e não de outra. Essa suposição pode até ser racionalizada, meticulosamente detalhada, inclusive com a presença de alternativas B e até C. Mas a suposição é ainda um tipo especial de imaginação.

O que transforma a imaginação em “realidade” no ponto de partida da criação tecnológica é que ela esteja em conformidade com as diretrizes orientadoras do suprimento de necessidades de um público-alvo real, aferido quantitativa, qualitativa e/ou qualiquantitativamente. Os dados reais conferem realidade ao projeto, enquanto os dados inventados são apenas imaginação de como a realidade supostamente se comporta. Essas considerações são extremamente importantes porque ainda há muitos grupos de pesquisadores e iniciativas que teimam em substituir os dados da realidade pelas maravilhas que suas simulações podem lhes mostrar e que, no futuro, próximo ou distante, se transformam em grandes impedimentos para a finalização do projeto e, consequentemente, para o sucesso da tecnologia gerada. É nesse sentido que o conhecimento das necessidades dos clientes deve orientar os procedimentos de prototipagem até que o protótipo seja galgado ao status de tecnologia.

O que é uma necessidade? A definição mais comum encontrada na ciência para necessidade é a que a vincula à fisiologia e à psicologia. Essa explicação diz que uma necessidade é uma forma de requisito, uma exigência, para que o organismo alcance o seu bem-estar. A necessidade é, portanto, sentida, o que a coloca na ordem dos sentimentos. Parece esquisito, mas quando alguém está com fome, a dor que ela experimenta é de cunho sentimental, de forma semelhante à exigência de um automóvel para transpor grandes distâncias: é uma exigência, um requisito do organismo para que possa fazer sua locomoção de forma agradável ou não muito penosa, como seria se fosse feita a pé.

Naturalmente, esse sentir é diferente de pessoa para pessoa, dependendo de vários fatores, principalmente os relativos à situação. Sob a ótica da prototipagem, conhecer esses sentimentos é fundamental para que as necessidades sejam supridas no decorrer daquela situação em que esse sentir é expresso, isso porque, se a situação mudar, muito provavelmente os requisitos da necessidade também terão mudado.

Outra concepção científica é que a necessidade é um gap, uma diferença, uma lacuna entre duas situações: a realidade presente e os resultados necessários ou desejados de uma outra realidade. Note mais uma vez a presença da situação. Se os resultados desejados fossem equivalentes aos resultados presentes, atuais, não haveria necessidade. Novamente aqui aparecem o fenômeno do sentimento (na forma de desejo) e da situação inadequada. É essa insatisfação (que é um sentimento) que aponta a presença de uma necessidade — uma disparidade entre aquilo que se tem e aquilo que se deseja, entre o real e o necessário. Sob a ótica dos esforços de prototipagem, o ponto de partida é o conhecimento dos requisitos desejados e dos requisitos atuais, para que a tecnologia faça a ponte entre esses dois pontos. Quando se leva essa concepção para a seara dos desempenhos, a necessidade seria a diferença entre o desempenho atual e o desejado. A prototipagem precisa mirar esse gap.

Uma terceira concepção científica vê a necessidade como uma falta. Esta é uma concepção muito parecida com a psicanalítica, que vê o ser humano como um ente incompleto e que, por essa razão, está condenado à busca eterna da completude. A necessidade, portanto, é aquilo que falta a uma pessoa, grupo de pessoas, organizações e instituições para lhe completar. Não é difícil perceber que essa completude é um sentimento. A pessoa, grupo de pessoas, organização ou instituição (ambas são compostas por pessoas) se sente ou não completa. Se o sentimento for de incompletude, surge a necessidade e, com isso, a busca de se completar.

O que vai diferenciar, também aqui, o que é ou não a completude é o bem-estar: se ele estiver presente, há completude. Para os esforços de prototipagem, é fundamental que sejam devidamente mapeados os atributos da falta para que ela seja entregue aos indivíduos através dos protótipos. Os protótipos passam a ser, neste caso também, um mecanismo material de suprimento de necessidades que vai eliminar a falta — o sentimento de falta — e restituir o bem-estar às pessoas.

Uma quarta noção de necessidade que predomina na literatura científica é a exigência de mudança. A exigência é um imperativo, não é apenas um desejo. Alguém pode desejar uma coisa e não querer realizá-la. A exigência vai além do querer, de maneira que há a obrigação da realização. Aqui, as pessoas, indivíduos, clientes, usuários, consumidores — enfim, o público-alvo — são forçados por alguma situação a demandar a tecnologia para que haja a mudança sobre a qual recai a obrigatoriedade da situação.

Foi o caso da pandemia de Covid, em que uma tecnologia era obrigatória (a vacina) para que houvesse a mudança obrigatória da realidade presente (o aumento crescente de mortos) para outra realidade (a contenção da doença), restituindo às pessoas o bem-estar desejado. A vacina foi possível porque os cientistas obtiveram conhecimento sobre as exigências do organismo humano e atenderam a essas exigências com um protótipo que rapidamente se transformou em tecnologia.

Os protótipos só conseguem se transformar em tecnologias e suprir as necessidades das pessoas se atentarem para dois aspectos fundamentais. O primeiro é que as necessidades são um sentimento e, como tal, precisam ser tratadas. Os protótipos precisam responder aos sentimentos para que possam ser aprovados, sem considerar outros atributos. O segundo é que as necessidades são uma exigência, uma falta, uma discrepância entre a situação presente e a desejada. O protótipo precisa fazer a ponte entre o agora e o futuro. O terceiro é que as necessidades são desejos que não são deixados de lado. Se o protótipo realizar esses desejos, ele será demandado.


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Articulista/Colunista

Dr. Daniel Nascimento e Silva

PhD, Professor e Pesquisador do Instituto Federal do Amazonas (IFAM)

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